Atualmente, o SUS só custeia o translado gratuito de restos mortais para fins de transplante, o que freqüentemente é alvo de críticas devido à possível influência na ordem da fila, beneficiando aqueles com mais poder ao invés de garantir um atendimento igualitário para todos. Essa realidade escancara a desigualdade social, comprovada por estatísticas que apontam a exclusão dos mais pobres.
É urgente que os pobres neste país tenham garantido o direito ao translado gratuito de um ente querido, seja entre estados, cidades ou até mesmo entre países, com o devido entendimento com as embaixadas. Essa é uma questão de justiça, cidadania, solidariedade e reconhecimento ao papel fundamental dos pobres na construção e no crescimento do país. O pobre gera demanda? Sim, mas também gera economia. Além disso, é o pobre quem mais trabalha e contribui diariamente para o desenvolvimento do Brasil. Não é justo que apenas o translado para transplantes seja custeado, enquanto o transporte de corpos para sepultamento seja ignorado.
A perda de um ente querido é um dos momentos mais difíceis para qualquer família, e nem sempre o falecimento ocorre na cidade de origem. Viagens a trabalho ou férias podem resultar em destinos inesperados devido a acidentes ou doenças imprevisíveis. Como líder comunitário e parlamentar sem mandato, já presenciei e intermediei diversos casos de famílias que, mesmo tomadas pela dor, lutaram para conseguir transladar seus entes queridos para suas cidades natais. Nesses momentos, a família se encontra vulnerável emocionalmente e financeiramente.
Em 2004, o então deputado federal João Campos, de Mato Grosso, apresentou um Projeto de Lei (PL) [clique e veja] para garantir o translado gratuito de corpos, fundamentado na falta de solidariedade entre empresas e na escassez financeira das famílias. O transporte aéreo, opção mais rápida para grandes distâncias, é também a mais cara, tornando-se inacessível para os mais pobres. As empresas de transporte, insensíveis à dor alheia, impõem preços exorbitantes, agravando ainda mais o sofrimento das famílias.


Minha própria experiência comprova essa realidade. Em junho de 2024, meu irmão passou mal e foi levado para uma emergência em Querência-MT, onde infelizmente veio a falecer. A família desejava transladar o corpo para São José de Ribamar, no Maranhão, mas o custo era altíssimo. Enquanto procurávamos alternativas para viabilizar o translado, enfrentando imensas dificuldades devido aos custos elevados, meus sobrinhos decidiram realizar o sepultamento em outra cidade de Mato Grosso, onde residem. Mesmo assim, o translado de Querência para a cidade onde eles moram, dentro do próprio estado, ainda teve um custo elevado.
O sofrimento do pobre no Brasil é imenso, especialmente em casos de translado. É necessário que o SUS ou outra fonte da União custeie essas despesas, com repasses para estados e municípios, desde que comprovada a situação de vulnerabilidade da família por meio de atestado de pobreza. Garantir o translado gratuito de corpos, é um ato de dignidade, justiça social e respeito aos mais humildes.
O PL 4389/2004, de autoria do deputado João Campos, embora bem fundamentado, travou na Câmara dos Deputados. Em 2023, o relator Ismael Alexandrino, de Goiás, alegou que o SUS já cobre essa despesa e que a ampliação do benefício geraria mais custos. Segundo o relator, tal medida poderia impor um ônus financeiro substancial ao Sistema Único de Saúde (SUS), desviando recursos vitais de outras áreas críticas da saúde pública. Ele também ressaltou que o SUS já possui um mecanismo para auxiliar no retorno dos corpos de pacientes que falecem enquanto estão em tratamento fora de seu domicílio, o que pode mitigar parte da necessidade identificada pelo projeto. Além disso, o relator argumentou que a implementação dessa medida traria desafios operacionais e financeiros significativos, exigindo uma estrutura regulatória complexa e potencialmente onerosa.


O Blog A Força das Comunidades questiona o relator da matéria na época, deputado federal Ismael Alexandrino (conforme foto acima), que deveria ter explicado melhor que mecanismo é esse que o SUS possui para auxiliar no retorno dos corpos de pacientes que falecem enquanto estão em tratamento fora de seu domicílio. O que ele realmente quis dizer com isso? Será se ele quis afirmar que já existe o translado de cadáveres, de um estado para outro, ou de uma cidade para outra dentro do mesmo estado? Ou até mesmo do exterior, em entendimento com as embaixadas? Ou será se o parlamentar se referiu apenas ao custo do paciente durante o período de tratamento internado em uma unidade de saúde fora de seu domicílio? O relator não foi claro em sua explicação, pois o SUS nunca ofereceu essas condições de retorno de corpos para os mais pobres deste país. Isso parece ter sido uma manobra para ter confundido a população e desviar a atenção da realidade. Se realmente existe esse apoio para o retorno dos corpos às famílias dos pacientes fora do seu domicílio, então por que o SUS nunca identificou essa despesa para a família do paciente falecido
Diante do que argumentou o relator, o relatório foi pela aprovação parcial do PL 4389/2004 apenas na parte que trata da gratuidade no transporte de órgãos e tecidos humanos para fins de transplante [clique e veja], propondo a exclusão da parte relativa ao transporte gratuito de cadáveres e restos mortais humanos. O relator, ao se posicionar contrariamente à proposição no que diz respeito ao transporte gratuito de cadáveres e restos mortais, ofereceu um substitutivo ao projeto de lei, solicitando aos pares que aprovassem o relatório apenas em relação à gratuidade do transporte de órgãos e tecidos humanos para transplantes, recomendando que a votação se restringisse a essa parte.
Para o Blog A Força das Comunidades, essa decisão do relator, representou um desrespeito para com os pobres deste país, que mais uma vez foram desprezados e abandonados pela Comissão de Saúde da Câmara dos Deputados. O Congresso Nacional não teve um olhar sensível para as dores dos mais humildes em situações como essa.
Em uma pesquisa recente realizada por este Blog, não conseguimos confirmar se o PL 4389/2004 foi sancionado pela Presidência da República. No entanto, constatamos a existência da Lei nº 2.288/2015, sancionada integralmente pelo presidente Lula em 21 de maio de 2024, que alterou a Lei nº 9.434/1997. Esta nova legislação institui a obrigatoriedade de reserva de vagas e espaço para o transporte de material destinado a transplantes e tratamentos, por vias terrestres, aéreas e aquáticas. Além disso, determina a gratuidade do transporte e a coordenação da atividade pelo Sistema Nacional de Transplantes (SNT). A priorização envolve tanto empresas privadas, como companhias aéreas, quanto instituições públicas e privadas, como a Força Aérea Brasileira e estruturas que fazem parte do Sistema Único de Saúde (SUS), ou seja, a lei garante o translado apenas para transplantes [clique e veja].
O Blog A Força das Comunidades entende que o presidente Lula, que se declara defensor dos pobres, deveria ter vetado essa limitação e devolvido a matéria ao Congresso Nacional para incluir a gratuidade também para o translado de cadáveres em todo o território nacional e, quando necessário, em casos internacionais, com o devido entendimento junto às embaixadas.
O Blog A Força das Comunidades faz um apelo ao presidente Lula e às representações das 27 unidades da federação no Congresso Nacional para que seja garantido aos pobres deste país o direito ao translado de cadáveres de entes queridos, custeado pelo SUS ou por outras fontes de repasse, em casos onde a família comprove situação de vulnerabilidade por meio de atestado de pobreza.
E você, o que acha? Comente aqui a sua opinião.
Tipos de transporte de corpos


